Por Dr. Richard Portier
em 18 de julho de 2020.
Os nossos hormônios são como mensageiros: viajam pelo corpo para avisar as células quais tarefas devem realizar. Por isso influenciam em tudo – nosso sistema imunológico, nossa energia, nosso humor, quão bem dormimos, nosso desejo sexual, nossa fome, a força de nossos músculos, a saúde de nossos ossos e muitos outros aspectos de nossa vida.
A deficiência de testosterona, chamada de hipogonadismo, é muito negligenciada no homem vivendo com HIV (HVHIV).
Isso acontece com mais frequente nas pessoas que realizaram o diagnóstico na fase AIDS, e com probabilidade menor nas diagnosticadas precocemente.
Qualquer que seja o estágio do seu diagnóstico, é uma boa ideia testar seus níveis de testosterona, e se necessário, restaurar esse equilíbrio.
Neste artigo você irá aprender qual a prevalência, os fatores de riscos, os sinais e sintomas e como tratar o hipogonadismo no HVHIV.
Usarei como referência o livro “Endocrinologia clínica”, 7.ª edição e o guideline da European AIDS Clinical Society, 11.ª edição, além de outros artigos específicos.
O artigo “Hypogonadism: a neglected comorbidity in young and middle-aged HIV-positive men on effective combination antiretroviral therapy”, publicado na revista AIDS em julho de 2022, nos demonstra qual é a prevalência e o fatores de risco associados ao hipogonadismo no HVHIV.
Neste estudo, 231 homens vivendo com HIV com idade entre 18 e 50 anos estavam com a carga viral indetectável (abaixo de 50 cópias/mL) em terapia antirretroviral por pelo menos 6 meses. O hipogonadismo foi definido, de acordo com as diretrizes, como uma concentração média calculada de testosterona livre no sangue inferior a 7,0 ng/dL.
Dos 231 homens, 20 (8,7%) estavam com hipogonadismo exclusivamente de origem secundária. Os fatores de risco para o hipogonadismo foram: idade superior a 43 anos, percentual de gordura total superior a 19% e tratamento incluindo efavirenz.
O que podemos concluir a partir deste estudo? Primeiro, que devemos solicitar o exame de testosterona total e testosterona livre para HVHIV com sintomas de hipogonadismo ou que apresentam os fatores de risco citados para realizar o diagnóstico.
Segundo, manter um percentual de gordura abaixo de 19% é fundamental para o tratamento. Mas o mais importante, para prevenir o problema. Por isso eu insisto tanto no treino de força para ganhar massa muscular, dieta para perder gordura corporal e suplementação para melhorar a performance. Dessa forma você alcançará e manterá uma boa composição corporal e níveis de testosterona.
Terceiro, se você utiliza o efavirenz e está com a deficiência, substituí-lo por outro antirretroviral, como o dolutegravir ou o darunavir, será fundamental para melhorar os níveis de testosterona.
Existem vários sinais e sintomas no hipogonadismo. Podemos dividi-los em 3 grupos: específicos, sugestivos e inespecíficos.
Apresentando os sintomas, o diagnóstico será realizado através dos exames de testosterona total e testosterona livre.
Se você está sentindo estes sintomas, converse com o seu médico.
Acredite, você pode fazer muito para manter bons níveis de testosterona no sangue.
Aqui estão diversas dicas práticas para você iniciar hoje:
Apesar de não ser protocolar a solicitação dos exames de testosterona no HVHIV, eu solicito rotineiramente para os meus pacientes. Quanto mais cedo você realizar o diagnóstico, mais cedo irá iniciar o tratamento e as mudanças no estilo de vida.
Realizar atividade física é a principal forma de aumentar a testosterona naturalmente.
Você deve ter como objetivo 150 minutos de atividade aeróbica moderada (ou 75 minutos de atividade aeróbica vigorosa) toda semana.
Uma maneira de fazer os 150 minutos recomendados é fazer 30 minutos em cinco dias por semana. Isso inclui atividades como caminhar rapidamente, correr, dançar, nadar, praticar esportes e andar de bicicleta.
Além disso, faça exercícios de fortalecimento muscular em dois ou mais dias da semana. O exercício de fortalecimento muscular inclui musculação ou crossfit.
Nós vimos anteriormente que o excesso de gordura corporal é um fator de risco associado ao hipogonadismo.
Ou seja, quanto mais gordura você perder, mais benefícios terá. Se você é homem, coloque como meta alcançar 19% de percentual de gordura. Se é mulher, 24%
O cigarro, o uso de álcool e drogas pioram os níveis de testosterona. Portanto, cesse o uso.
Realizado o diagnóstico do hipogonadismo (deficiência de testosterona), a terapia de reposição de testosterona (TRT) visa, principalmente, restaurar níveis normais do hormônio, melhorar a qualidade de vida e reduzir a mortalidade do homem que vive com HIV.
A testosterona pode ser administrada pela via oral, bucal, nasal, intramuscular, transdérmica (gel ou adesivos) ou subcutâneas (implantes ou subcutâneas).
Porém, antes, é necessário escolher uma das formas de apresentação. E todas possuem vantagens e desvantagens, por isso a conduta precisa ser individualizada.
Entre as intramusculares, o undecilato de testosterona (Nebido®) tem a vantagem da maior comodidade posológica, já que pode ser administrada a cada 10 a 14 semanas. Também mantém menor oscilação nos níveis séricos do hormônio e, portanto, resposta mais estável e mais satisfatória. Porém, seu custo é o mais elevado quando comparado ao Durateston® (fenilpropionato + isocaproato + propionato + decanoato de testosterona) ou Deposteron® (cipionato de testosterona). Esse custo inferior é o principal benefício dessas duas apresentações. As desvantagens são: os níveis séricos altamente variáveis, o que propicia flutuações na libido, no humor e na qualidade de vida; episódios de tosse após a aplicação; e o maior risco de eritrocitose.
O gel de testosterona a 1% (Androgel®) tem a vantagem de manter níveis séricos mais estáveis, porém apresenta custo elevado, pode causar reações alérgicas cutâneas e necessita aplicação diária. Além disso, existe a possibilidade de transferência para terceiros, como parceiros sexuais ou filhos.
A seguir está um resumo das principais apresentações:
Testosterona em gel 1% (Androgel®)
Cipionato de testosterona (Deposteron®)
Fenilproprionato + isocaproato + propionato + decanoato de testosterona (Durateston®)
Enantato de testosterona (Nebido®, Hormus®)
Assim como qualquer tratamento medicamentoso, a terapia de reposição hormonal apresenta benefícios, riscos e contraindicações.
Benefícios: desenvolvimento ou manutenção das características sexuais secundárias; melhora da libido e da função sexual; aumento de massa e força muscular; aumento da densidade óssea; diminuição da gordura corporal e visceral; melhora do humor; efeito nas funções cognitivas e na qualidade de vida.
Riscos: retenção de líquidos; aumento da hemoglobina e do hematócrito (eritrocitose); ginecomastia; acne ou pele oleosa; diminuição do colesterol HDL; agravamento ou precipitação da apneia obstrutiva do sono; hiperplasia prostática benigna.
Riscos controversos: aumento do risco cardiovascular; carcinoma de próstata; comportamento agressivo.
Contraindicações:
Por isso que antes de iniciar a TRT, é necessário investigar o desejo de procriar, apneia obstrutiva do sono, história pessoal ou familiar de câncer de próstata ou mama, sintomas de hiperplasia prostática benigna e de insuficiência cardíaca. Além disso, uma avaliação laboratorial essencial para determinar valores de hemoglobina, hematócrito e PSA (a partir dos 40 anos). Deve ser realizado também um exame prostático digital a partir dessa idade.
Como qualquer tratamento, é necessário avaliar a eficácia e ajustar a dose, caso necessário, de preferência a cada 3 meses.
Além disso, é necessário o monitoramento dos efeitos colaterais, por causa das possíveis contraindicações.
Exame digital retal:
Níveis de PSA:
Hematócrito:
Sintomas graves do trato urinário inferior: descontinuar caso apresente sintomas.
Apneia obstrutiva do sono: pesquisar sintomas como roncos noturnos, sonolência diurna, etc.
Densidade óssea: solicitar exame de densitometria óssea, se indicado, antes do tratamento e a cada 1 a 2 anos.
O tratamento do hipogonadismo induzido por esteróides anabolizantes é diferente do que vimos anteriormente.
A primeira fase do tratamento, com duração de 4 semanas, é realizada com um modulador seletivo do receptor de estrogênio (SERM), como o citrato de clomifeno 25 mg/dia ou 50 mg em dias alternados. Esse medicamento estimula a produção de LH, e consequentemente, pode aumentar os níveis de testosterona. Caso o paciente apresente sintomas de hipogonadismo, a testosterona em gel pode ser necessária.
Após 4 semanas de tratamento com SERM, com ou sem TRT associado, solicita-se novos exames de testosterona e LH. Caso o paciente não apresente resposta, acrescenta-se hCG 1000 a 3000 UI 3x por semana. Contudo, devido a limitação da apresentação nessa posologia, tem-se indicado 5000 UI 1 x por semana. Além disso, a TRT é suspensa.
Após 8 semanas, solicita-se novos exames. Se resposta, reduzir o SERM em 50% na 10.ª de tratamento. Entre a 12.ª e 16.ª semana de tratamento, novamente novos exames, e se atingido o alvo de testosterona, o SERM é suspenso.
Se, em 12 a 16 semanas de tratamento os níveis de testosterona não se normalizarem, há falência testicular primária por toxicidade dos esteróides anabolizantes. Nessa situação a TRT pode ser necessária de forma permanente.
Graduado pela Universidade Positivo, é Médico Infectologista graduado pelo Programa de Residência Médica em Infectologia do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná, Membro da Sociedade Brasileira de Infectologia e Membro da Internacional AIDS Society.
Com grande experiência na saúde das pessoas que vivem com HIV, fez estágio no Instituto de Infectologia Emílio Ribas e trabalhou na Unidade de Internamento de Infectologia e no Ambulatório de HIV/AIDS do Hospital de Clínicas – UFPR. Hoje possui um consultório privado em Curitiba onde realiza consultas online para todo o Brasil.
Sua missão é melhorar o físico, a saúde e a confiança das pessoas vivendo com HIV.
Nenhuma informação desta página e dos nossos produtos substitui uma consulta presencial com seu médico. Jamais faça nenhuma mudança no seu tratamento sem antes consultar seu médico ou profissional de saúde. É só ele quem poderá avaliar de perto a sua situação atual e decidir se você está apto ou não à essas alterações. Portanto, é imprescindível que você tenha acompanhamento médico para sua segurança. Se tiver qualquer dúvida, envie um email para [email protected] que responderemos o mais breve possível. Obrigado!
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