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ARTIGOS

Fígado e o HIV: como ser um aliado

Por Dr. Richard Portier

em 18 de julho de 2020.

O fígado é um órgão vital: você não conseguiria viver sem ele. O maior órgão interno sólido do corpo humano, funciona 24 horas, 7 dias por semana, para executar mais de 300 funções.

Ele metaboliza e armazena nutrientes dos alimentos que ingerimos. Ajuda a processar os medicamentos que tomamos. Remove os resíduos do nosso sangue. Decompõem e desintoxica substâncias nocivas. Regula nossos hormônios. Cria proteínas necessárias para o sistema imunológico. Ajuda a combater infecções. Além de diversas outras funções.

Neste artigo vamos conhecer a doença hepática que mais me preocupa na pessoa vivendo com HIV (PVHIV), e como ser um aliado e não um inimigo deste importante órgão.

Como funciona o fígado

Como funciona um filtro d’água?

A água chega através de um cano, onde será filtrado pelo filtro e depois, através de outro pequeno cano dentro do próprio filtro, levará a água ao seu copo. Simples assim.

Agora imagine que esse filtro está endurecido e danificado. A água não conseguirá passar com a mesma facilidade que antes, e também não será filtrada com a mesma qualidade. Resultado: começa a acumular água antes de entrar no filtro, o fluxo estará diminuído e água cheia de toxinas.

O fígado funciona de forma semelhante. O sangue, através das veias (cano), chega ao fígado (filtro), onde será filtrado, e distribuído para o resto do corpo.

Porém, se o fígado estiver endurecido, e danificado, o sangue não conseguirá passar com a mesma facilidade, e também não filtrará com a mesma qualidade. Resultado: começará a acumular nas veias, causando varizes no esôfago e no abdome. Além disso, o fluxo ficará prejudicado, causando inchaço, e o sangue estará cheio de toxinas, causando confusão mental, chamado de encefalopatia hepática.

O fígado endurecido chama-se cirrose hepática. E essa fibrose pode ser causada por diversos motivos, mas os principais são:

  • Uso de álcool, drogas e anabolizantes.
  • Por vírus, sendo os principais, a hepatite B e a hepatite C.
  • Gordura no fígado, chamada de esteatose hepática, causada pelo sobrepeso e obesidade.
  • Medicamentos.
  • Exposição química.
  • Causas genéticas.

Fígado e o HIV

Dentre as principais causas, a esteatose hepática, conhecida como gordura no fígado, é a que eu tenho realizado diagnósticos. Principalmente na faixa etária entre os 25 e 40 anos.

No estudo “Prevalence and risk factors of nonalcoholic steatohepatitis with significant fibrosis in people with HIV” publicado na AIDS em outubro de 2022, entre 282 PVH, 100 (35,5%) estavam com esteatose hepática. O principal fator de risco para desenvolvê-la foi o aumento da circunferência abdominal, maior que 94 cm nos homens e 80 cm nas mulheres.

Isso me preocupa, pois, esse acúmulo de gordura no fígado traz duas consequências importantes: fibrose do fígado e aumento do risco cardiovascular.

No mesmo estudo, 19 (6,7%) PHV estavam com grau 2 ou mais de fibrose, considerado pelos autores como significativo. O principal fator de risco para desenvolvê-la foi a diabetes. Na revisão “Causes and outcomes of hepatic fibrosis in persons living with HIV” publicado na Current Opinion in HIV and AIDS em outubro de 2022, uma das principais causas encontradas de fibrose hepática foi a esteatose.

Além disso, o artigo “Dangerous liaisons: NAFLD and liver fibrosis increase cardiovascular risk in HIV”, publicado na HIV Medicine em fevereiro de 2022, concluiu que a esteatose hepática e a fibrose hepática são fatores para aumentar o risco cardiovascular. Ou seja, ter gordura no fígado pode aumentar a chance de um evento como o infarto e o AVC.

Diagnosticando danos no fígado

Por isso o diagnóstico é fundamental. Eu solicito o exame de ultrassom para todos os pacientes com excesso de gordura corporal, aumento da circunferência abdominal, hipertrigliceridemia, síndrome metabólica ou alterações em TGO e TGP. Caso o paciente tenha diabetes, eu solicito a elastografia hepática para o diagnóstico da fibrose.

Seja um aliado do seu fígado

Acredite, você pode fazer muito para proteger o seu fígado. Para isso, elimine o maior número possível de fontes de toxicidade.

Aqui estão diversas dicas práticas para você iniciar hoje:

Faça o acompanhamento médico

A cada 6 meses, no mínimo, seu médico solicitará vários exames de sangue para avaliar danos ou inflamação no seu fígado, que servem para realizar o diagnóstico precoce da lesão hepática.

Os principais são: TGO, TGP, bilirrubinas, albumina e RNI. Outros podem ser indicados, de acordo com a indicação médica.

Esses exames são ainda mais importantes se você já possui dano no fígado – devido à hepatite, consumo de álcool ou drogas, ou esteatose hepática, por exemplo.

Quanto mais cedo você realizar o diagnóstico, mais cedo irá iniciar o tratamento e as mudanças no estilo de vida.

Cesse o tabagismo, o uso de álcool, drogas e esteróides anabolizantes

O cigarro, o uso de álcool, drogas e esteróides anabolizantes são fatores de risco para desenvolver a lesão hepática. Portanto, cesse o uso.

Tome a vacina contra a hepatite A e B

As vacinas para hepatite A e hepatite B são amplamente distribuídas pelo SUS, e são indicadas para as PVHIV.

Por isso, tome as vacinas. É uma forma fácil de prevenção.

Reduza a exposição à substâncias químicas

Se possível, evite ser exposto a produtos químicos ou reduza sua exposição.

No local de trabalho, ou em outros lugares, evite ser exposto a vapores químicos, como gasolina, solventes, pesticidas e herbicidas. Reduza sua exposição usando equipamentos de proteção individual.

Evite tomar medicamentos desnecessários

Todos os medicamentos são metabolizamos pelo fígado.

Quando menos medicamentos você tomar, menos seu fígado trabalhará e terá toda sua força voltada para metabolizar seus antirretrovirais.

Exercite-se regularmente

Realizar atividade física regularmente ajuda a diminuir a esteatose hepática e aumenta a sensibilidade à insulina das células. Portanto, quando você se exercita, menos insulina é necessária para manter seus níveis de açúcar no sangue sob controle e você queima gordura no fígado.

Portanto, planeje seu programa de exercícios e converse com o seu médico.

Você deve ter como objetivo 150 minutos de atividade aeróbica moderada (ou 75 minutos de atividade aeróbica vigorosa) toda semana.

Uma maneira de fazer os 150 minutos recomendados é fazer 30 minutos em cinco dias por semana. Isso inclui atividades como caminhar rapidamente, correr, dançar, nadar, praticar esportes e andar de bicicleta.

Além disso, faça exercícios de fortalecimento muscular em dois ou mais dias da semana. O exercício de fortalecimento muscular inclui musculação ou crossfit.

Mantenha um peso saudável

O excesso de gordura na barriga leva ao acúmulo de gordura no fígado.

Ou seja, quanto mais gordura você perder, mais benefícios terá. Se você é homem, coloque como meta alcançar 19% de percentual de gordura. Se é mulher, 24%.

Coma alimentos que ajudam o fígado

Ter uma alimentação bem equilibrada que inclua frutas e vegetais, boas fontes de proteínas e gorduras boas será fundamental para você evitar a esteatose hepática e a resistência à insulina.

Consuma uma variedade de frutas e vegetais coloridos para fornecer antioxidantes que protegem o fígado e ajudam no processo de detoxificação.

Além disso, a fibra desses alimentos ajudam a eliminar toxinas através do intestino, reduzindo a carga de trabalho do fígado. Alguns suplementos, como o psyllium, ou farelo de aveia, podem aumentar sua ingestão de fibras.

As gorduras boas do azeite, nozes, sementes, abacates e peixes gordos são mais fáceis para o fígado processar e ajudam a criar membranas celulares ao redor de suas células. 

Por outro lado, gorduras ruins, como gorduras trans, são responsáveis pelo aumento de lipídeos e a esteatose hepática, por isso, tire-as da sua alimentação.

Beba chás e café, e troque os doces por chocolate com 70% de cacau – todos são ricos em antioxidantes.

Se possível, escolha alimentos orgânicos, pois não contêm os pesticidas que são pulverizados em muitas frutas, vegetais e grãos, ou os resíduos de antibióticos encontrados em carnes, frangos, ovos e peixes.

Os alimentos orgânicos tendem a ser mais caros, e eu sei. Muitos não podem pagar. Mas se você puder comprar orgânicos ocasionalmente, priorize maçãs, aipo, pimentão, pêssego, morango, nectarina, uva, espinafre, alface, pepino e batata, pois são os que mais absorvem pesticidas.

Por fim, certifique-se de beber bastante água para ajudar a eliminar as toxinas.

Evite alimentos que prejudicam o fígado

O xarope de milho e o açúcar branco são os grandes vilões, por isso reduzir o consumo é necessário. Ambos estão na maioria dos alimentos industrializados e processados, como sucos, refrigerantes, sorvetes, bolos, biscoitos, barras de chocolate, cereais matinais e doces.

Quantidades significativas também são encontradas em frios, condimentos, sopas e legumes enlatados, maionese, molhos para salada, ketchup e muitos pães comerciais. Portanto, para reduzir a ingestão de açúcar, coma comida de verdade.

Ao ler rótulos, lembre-se de que todos esses são açúcares: xarope de milho, xarope de milho com alto teor de frutose, xarope de glicose/frutose, sacarose, glicose, frutose, dextrose, maltose, suco de cana evaporado, açúcar de cana, açúcar de beterraba, maltodextrina, açúcar de milho, malte de cevada, caramelo e xarope de alfarroba. Se você ver algum, fuja!

Para pessoas com doença hepática moderada ou grave, certas restrições alimentares podem ser necessárias, como uma dieta pobre sal, assim como a quantidade de proteína que você consome pode precisar ser limitada.

Utilize suplementos

O estudo “Vitamin E is an effective treatment for nonalcoholic steatohepatitis in HIV mono-infected patients”, publicado na AIDS em fevereiro de 2020, demonstrou benefício de suplementar vitamina E 800 UI na PVHIV com esteatose hepática.

infectologista curitiba

Dr. Richard Portier

Graduado pela Universidade Positivo, é Médico Infectologista graduado pelo Programa de Residência Médica em Infectologia do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná, Membro da Sociedade Brasileira de Infectologia e Membro da Internacional AIDS Society.

Com grande experiência na saúde das pessoas que vivem com HIV, fez estágio no Instituto de Infectologia Emílio Ribas e trabalhou na Unidade de Internamento de Infectologia e no Ambulatório de HIV/AIDS do Hospital de Clínicas – UFPR. Hoje possui um consultório privado em Curitiba onde realiza consultas online para todo o Brasil.

Sua missão é melhorar o físico, a saúde e a confiança das pessoas vivendo com HIV. 

Médico Infectologista

CRMPR 32.357

RQE 23.586

Nenhuma informação desta página e dos nossos produtos substitui uma consulta presencial com seu médico. Jamais faça nenhuma mudança no seu tratamento sem antes consultar seu médico ou profissional de saúde. É só ele quem poderá avaliar de perto a sua situação atual e decidir se você está apto ou não à essas alterações. Portanto, é imprescindível que você tenha acompanhamento médico para sua segurança. Se tiver qualquer dúvida, envie um email para richard@richardportier.com que responderemos o mais breve possível. Obrigado!

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